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Desafios para a reeducação patrimonial

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023 às 19:46 - por, admin.

Nacionalismo que negou a nação


Órgãos de proteção, de pesquisa e de difusão da memória nacional sofreram sucessivas tentativas de sucateamento, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Fundação Palmares e Universidades Federais que padeceram com cortes orçamentários.


A preservação do patrimônio cultural é um princípio de civilidade, um marco de cidadania quando a comunidade tem vez e voz para participar efetivamente da salvaguarda de seus bens culturais. Essas acepções indicam como as instituições e a sociedade lidam com a proteção da memória social. De acordo com a Constituição Cidadã, o patrimônio cultural possui natureza indivisível e representa uma coletividade indeterminada de pessoas que não podem ser individualizadas. Trata-se de um interesse difuso que somente pode ser assegurado dentro de um panorama comunitário, pois o patrimônio cultural pertence a todos e ao mesmo tempo não há relação de pertencimento de forma individual.

Apesar do nacionalismo alegórico sustentado pelo governo Bolsonaro, houve uma indiferença sistematizada às políticas públicas preservacionistas e aos direitos culturais do povo brasileiro. Além disso, foi instaurado o silenciamento com a memória e a identidade cultural do País. Os órgãos de proteção, de pesquisa e de difusão da memória nacional sofreram sucessivas tentativas de sucateamento, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Fundação Palmares e as Universidades Federais que padeceram com cortes orçamentários, ataques difamatórios e até a inviabilidade de projetos científicos por falta de investimentos.

O que ocorreu em 8 de janeiro não foi balbúrdia, foi barbárie. Essa data deve ser relembrada como uma demarcação contra o vandalismo cultural. O patriotismo sustentado negou a nação em sua diversidade étnica, artística, científica e paisagística. E isso não se restringiu apenas na negligência de políticas públicas no âmbito institucional ou simbólico. Mas violou direitos essencialmente coletivos, com a depredação de acervos que representam valores materiais e imateriais do patrimônio cultural do nosso país-continente. É necessário reestabelecer políticas públicas preservacionistas específicas e democráticas que atendam às diretrizes da Constituição de 1988, como o respeito aos direitos difusos, a municipalização dos artefatos culturais e a sistematização de ações educativas centradas na proteção, valorização e difusão do patrimônio cultural, como um bem comum do povo brasileiro. O poeta Mario de Andrade escreveu um aforismo certeiro. “O passado é lição para se meditar, não para se reproduzir”.

Texto: Éverlan Stutz é professor, jornalista, pós-graduado em Gestão do Patrimônio Cultural pela PUC Minas  e Articulista do Jornal Estadoatual

Foto Capa: Banco de imagem – Internet